quinta-feira, 12 de junho de 2008

A hortinha

No decurso da minhas matutinas digressões,já tinha passado muitas vezes por aquele
quintalinho.Quando muito,a sua área andaria pelos cem metros quadrados.
Eu não percebo nada de agricultura, mas gosto de ver coisas bem feitas.
Aquela hortinha, tinha um pouco de quáse tudo; Couves galegas (as do caldo verde),
couves pencas, vagens ( que lá pela capital chamam de feijão verde),cebolas ,alhos...
Via-se que tudo tinha sido feito com muito agrado.
Naquele dia parei.
Parei, porque o autor de tão asseada horta, estava à vista.
Mas não estava a trabalhar na sua horta...encostado ao longo cabo da sua sachola estava a contemplá-la!...
Dei-lhe os parabéns e os seus "agradecimentos" duraram mais de uma hora a ser-me dados. O hortelão, tinha fome de falar da sua obra.
Comecei a trabalhar na terra, diz-me ele,quando tinha dez anos.Mas não eram terras
deste tamanho!...eram terras enormes, que levavam meses a amanhar...
Trabalhei muitos, muitos anos...sempre gostei do que faço...
Fez uma pausa e mudou de assunto.
Aqui há uns bons anos, eu sempre urinei muito bem,o meu rim direito começou a asnear.
Passei a ser tratado no Hospital de S.João. Os senhores doutores, de tanto andarem à
volta de mim,resolveram tirá-lo...eu ainda lhes perguntei;Estava ruim o meu rim senhor doutor? Ruim ?! respondeu ele,estava bom para dar ao gato!...E tenha cuidado,
porque o outro rim, o que ainda está bom, tem cinco anos para lhe provar que consegue
fazer sozinho o seu trabalho...Eu bem percebi o que eles queriam dizer com aquilo...
Agora, voltou a mudar de assunto,o que me anda a afligir é a coluna!...
Agarrado à cintura, enquanto fazia uma careta,acrescentou;A sachola já pesa muito...
em cima dos meus oitenta e três...
Eu,que tinha de completar o meu pedestre giro,fiz menção de me despedir mas, o hortelão não consentiu ao perguntar; e você,quantos anos tem?
Lá lhe disse a minha idade.
Torceu ligeiramente o pescoço, dizendo: Não está mal, não senhor...
Fez uma pausa, para depois dizer; Olhe senhor, eu não sei a sua graça, mas tenho que
lhe dizer uma coisa...nunca ninguém tinha gabado tanto a minha horta...muito obrigado.
O nó da sua garganta,moveu-se.
Para disfarçar,tossiu...
Depois,com um enorme lenço vermelho,sonoramente,fingiu que assoava o nariz...

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