domingo, 13 de novembro de 2011

Tempos de crise

Há dias, neste mesmo local de paragem do autocarro da carreira 94, junto do mercado do Bolhão,
assisti à modesta demonstração de um cachorrito que ajudava o seu jovem domador a receber na latita que portava suspensa da coleira, a esmola de umas moeditas.

Dias depois, nesta mesma paragem do 94, observei um homem pobremente vestido que se deslocava com o auxilio de duas bengalas canadianas.
Cantarolava e, como instrumento, batia - uma na outra - com o aluminio das hastes das suas duas canadianas.
Como é bom de ver, os sons resultantes das batidas não eram muito agradáveis...valia-lhes o ritmo, que era sofrivel.´

Desci a rua de Sá da Bandeira e breve cheguei ao Terreiro da Sé, para uma visita à casa onde teria residido Dom Hugo e ao museu Guerra Junqueiro, situado mesmo ao lado. Mas, porque o grupo a que eu pertencia ainda não estava presente, decidi esperar sentado nos degraus do Pelourinho.
E, porque o granito do degrau estava muito frio, abri um livro que trazia na minha sacola e sentei-me sobre as suas páginas abertas.

Enquanto esperava fui olhando em meu redor e pude ver, para além de inúmeros turistas, situações inesperadas.

----Um rapazote de boné caído sobre os olhos e encavalitado sobre uma bicicleta, fazia as mais espantosas cabriolices à volta de todo o amplo terreiro da Sé.
Ateitei no ciclista e reparei que, de vez em quando, passava tangencialmente por um autimóvel de cor preta e de vidros fumados que estava estacionado junto da casa dos vinte e quatro.
Não pude ver quem se sentava ao volante do espada preto, mas pela nesga da aberta janela do condutor, pareceu-me ver uma figura masculina de chapéu preto, cuja aba lhe escondia parte do rosto.

----Entretanto, uma figura de aspecto feminino, botas pretas de cano alto, casaco comprido de cor preta e barra felpuda a roçar o cano das botas, depois de subir a calçadinha de acesso ao terreiro - mesmo em frente do Café/Bar Calhambeque, aproxima-se dos degraus do pelourinho onde eu estava sentado, quando é interpelada pelo ciclista, que lhe diz de passagem qualquer coisa que não pude ouvir.
A tal figura de aspecto feminino interrompe imediatamente a sua caminhada e, retrocedendo, volta a descer a calçadinha.
Parece-me lógico deduzir que havia uma qualquer relação entre o malabarista ciclista, o espada preto e esta figura de feminino aspecto.
Jamais terei confirmação.

----Quase ao mesmo tempo, dois jovens, um rapaz e uma rapariga, passam por mim vagarosamente. Ele olha para mim e continua o seu caminho. Ela, pouco depois olha também e sorri para mim. Eu, enquanto devolvia o sorriso, pensava: Devem ser turistas...
Decorridos poucos segundos, para meu espanto, vejo sentar-se no degrau, ao meu lado, a sorridente "turista" que me pergunta com a maior naturalidade deste mundo: Você está de visita a este local pela primeira vez? Não precisa de uma guia?
Fiquei esclarecido.

Depois, já com a presença do meu grupo, começava a visita às ruínas da residencia do ilustre Dom Hugo, que terá governado esta cidade do Porto, nos primórdios da sua fundação.
Curiosamente, misturadas com as palavras sábias do nosso guia, ainda ouvia a "turista" perguntar-me: Não precisa de uma guia ?

Duas horas depois e de acordo com a imposição dos meus 87, desci vagarosamente a ladeira, ladeei a Estação de S.Bento e trepei depois até ao Bolhão.
O 55, com destino a Baguim, deixar-me-ia em S. Roque, a dois passos da minha casa.

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